sexta-feira, 5 de junho de 2020

Vista como matéria-prima do futuro, madeira ganha espaço na construção civil


O maior edifício comercial de madeira da Austrália foi inaugurado em Brisbane, projetado pela Bates Smart.

Por Henrique Cisman

Casas ou edifícios de madeira podem ainda não ser comuns no Brasil, mas têm ganhado cada vez mais espaço na construção civil por aliar características como sustentabilidade, redução de custos diretos e indiretos, aumento da produtividade e conforto, tudo isso alicerçado pela tecnologia aplicada desde o plantio até o tratamento da matéria-prima.
Com 15 anos de atuação no mercado de commodities, a Amata está construindo uma fábrica para produção de madeira engenheirada no Sul do país visando atender em larga escala o mercado imobiliário brasileiro. De acordo com a empresa, a unidade será inaugurada em janeiro de 2022 e poderá fornecer de imediato a matéria-prima para as construtoras.
“É uma fábrica de volume: vamos produzir, no momento de maturação (estágio inicial), 60 mil m³ por ano, o que significa que vamos ter preço. Essa é a grande ousadia da Amata, pois o mercado [de beneficiamento de madeira] ainda não existe [no Brasil], e enquanto não houver fábrica de volume, ele não vai existir, porque é preciso ter preço”, destaca a gerente de projetos da empresa, Ana Belizário.
Atualmente, existem no Brasil indústrias de madeira engenheirada focadas principalmente em unidades de residencial unifamiliar, explica a arquiteta. “Foi uma tendência natural do mercado até agora, mas uma vez que essa solução seja adotada de forma mais estruturada, essas indústrias também têm capacidade de se ampliar, aumentar a capacidade de produção [para larga escala]”. 
Enquanto a fábrica não fica pronta, a Amata experimenta o produto em projetos-piloto, como um edifício comercial de três pavimentos na região oeste de São Paulo, no qual a estrutura de madeira já foi entregue e a inauguração deve ocorrer ainda em 2020. “Nestes dois anos [até a fábrica ficar pronta], vamos continuar importando o material de uma parceira austríaca, que é uma garantia de experiência para a abertura desse novo mercado”, afirma Belizário.
Prédio de três pavimentos em madeira engenheirada está em fase final de construção em São Paulo. Foto: Amata
 Tal qual outros especialistas têm apontado, ela vê a madeira como matéria-prima do futuro para a construção civil: “A madeira responde muitas questões em uma, resolve a questão de supply (fornecimento) de matéria-prima, de onde é tirado o recurso, e está sendo discutida em diversos setores: alimentício, construção civil, transporte, infraestrutura, geração de energia. Ela está alinhada ao pensamento contemporâneo, é leve, rápida, trabalhável e consegue fazer um canteiro de obras em tempo muito reduzido. Não é um discurso estético”, ressalta.
Tecnologia que gera resultados
A exploração de pinus (espécie utilizada pela Amata) se inicia no plantio das mudas e vai até o envio da madeira tratada para o canteiro de obras. Nesse caminho, muita tecnologia é aplicada para garantir o sucesso do produto, a começar pela silvicultura, que no Brasil tem ótimo desempenho. Segundo a especialista, o ciclo de crescimento das árvores é seis vezes mais competitivo do que nos mercados americano e europeu.
Depois de extraída, a madeira passa por um longo processo de secagem, classificação mecânica e visual, para então ser tratada (ou beneficiada). “Essa etapa é chamada de safe inside, isto é, embarcar tecnologia na matéria-prima”, afirma Belizário. 
Na sequência, a madeira é direcionada para a linha industrial, basicamente composta por prensas hidráulicas e um processo de usinagem. “Esse ciclo de tecnologia garante, em cada etapa, estabilidade dimensional, precisão e durabilidade, que são aspectos importantíssimos para a construção civil”.
O produto final – a madeira engenheirada – sai em módulos prontos para serem montados no canteiro de obras, tal como lego, incluindo furações, rebaixos, recortes, portas e janelas. “Os componentes hidráulicos e elétricos são inseridos no canteiro, mas a madeira engenheirada permite que haja furação [prévia] desses sistemas, o que costuma ser um ponto bastante crítico na construção”, explica a arquiteta.
Nos métodos convencionais, as paredes e lajes primeiro são construídas para depois haver os cortes, ou seja, ao utilizar madeira engenheirada há ganhos de tempo, economia de recursos e menor risco de acidentes no canteiro.
Resultados em números
Comparando lajes de madeira engenheirada a lajes de parede de concreto, a proporção de trabalhadores no canteiro de obras é de cinco para 80, informa a arquiteta Ana Belizário. Ou seja, uma redução de 16 vezes na quantidade de funcionários. De acordo com a Amata, uma taxa média de montagem utilizando madeira engenheirada corresponde a 300 m² por dia em uma equipe de cinco pessoas.
O sistema também resulta em redução de prazo: em um projeto cujo cronograma esteja bem alinhado com todas as frentes de trabalho, essa redução varia entre 40% a 50% do tempo, ganho expressivo para o canteiro de obras.
Cálculo do custo-benefício para o incorporador
De acordo com Ana Belizário, observar apenas o custo por m³ (metro cúbico) não é a melhor forma de calcular se vale ou não a pena o investimento: “Além dos orçamentos de obra, é importante analisar os custos indiretos que podem ser otimizados para que o custo final geral seja equivalente ou até menor”, avalia. 
Nessa conta, é preciso considerar o tempo da obra no canteiro, a gestão dos resíduos produzidos, o risco de atraso na entrega e todos os problemas gerados por esse descumprimento do prazo inicial.
“Acreditamos que vai acontecer no Brasil o efeito ‘planejado versus entregue’, como já ocorre no mundo. A viabilidade de um produto imobiliário carrega muito risco porque o ciclo é longo, estamos falando de três anos entre viabilidade, desenvolvimento de projeto e construção. Qualquer atraso pode ter impacto muito grande”, explica Belizário.
Para o consumidor, o preço da unidade é competitivo em relação a imóveis construídos com outros materiais, mas a percepção de valor é aumentada, segundo a arquiteta: “A sensação geral para o consumidor final, via de regra, é de um produto mais robusto, mais agradável, mais bonito e confortável”.
Qualidade, durabilidade e manutenção dos imóveis em madeira
Com madeira engenheirada, a vida útil do empreendimento alcança os 50 anos, conforme exigido pela norma de desempenho brasileira. Em relação à temperatura interna e isolamento acústico das unidades, construções em madeira geram maior conforto ambiental, sobretudo na questão térmica. 
Para que o imóvel seja adequadamente preservado no decorrer do tempo, a madeira engenheirada requer maior atenção principalmente à umidade, ocorrência de cupins e outros insetos. Ainda que a madeira seja tratada industrialmente, o monitoramento é uma forma de manutenção a longo prazo. “A madeira não exige manutenção maior do que a necessária em outros sistemas”, diz Belizário.
Fonte: Smartus

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