Por Henrique Cisman
Casas ou edifícios de madeira podem ainda não ser comuns no Brasil, mas
têm ganhado cada vez mais espaço na construção civil por aliar características
como sustentabilidade, redução de custos diretos e indiretos, aumento da
produtividade e conforto, tudo isso alicerçado pela tecnologia aplicada desde o
plantio até o tratamento da matéria-prima.
Com 15 anos de atuação no mercado de commodities, a Amata está
construindo uma fábrica para produção de madeira engenheirada no Sul do país
visando atender em larga escala o mercado imobiliário brasileiro. De acordo com
a empresa, a unidade será inaugurada em janeiro de 2022 e poderá fornecer de
imediato a matéria-prima para as construtoras.
“É uma fábrica de volume: vamos produzir, no momento de maturação
(estágio inicial), 60 mil m³ por ano, o que significa que vamos ter preço. Essa
é a grande ousadia da Amata, pois o mercado [de beneficiamento de madeira]
ainda não existe [no Brasil], e enquanto não houver fábrica de volume, ele não
vai existir, porque é preciso ter preço”, destaca a gerente de projetos da
empresa, Ana Belizário.
Atualmente, existem no Brasil indústrias de madeira engenheirada focadas
principalmente em unidades de residencial unifamiliar, explica a arquiteta.
“Foi uma tendência natural do mercado até agora, mas uma vez que essa solução
seja adotada de forma mais estruturada, essas indústrias também têm capacidade
de se ampliar, aumentar a capacidade de produção [para larga escala]”.
Enquanto a fábrica não fica pronta, a Amata experimenta o produto em
projetos-piloto, como um edifício comercial de três pavimentos na região oeste
de São Paulo, no qual a estrutura de madeira já foi entregue e a inauguração
deve ocorrer ainda em 2020. “Nestes dois anos [até a fábrica ficar pronta],
vamos continuar importando o material de uma parceira austríaca, que é uma
garantia de experiência para a abertura desse novo mercado”, afirma Belizário.
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Prédio de três pavimentos em madeira engenheirada está em fase final de construção em São Paulo. Foto: Amata |
Tal qual outros especialistas têm apontado, ela vê a madeira como
matéria-prima do futuro para a construção civil: “A madeira responde muitas
questões em uma, resolve a questão de supply (fornecimento) de matéria-prima, de onde é
tirado o recurso, e está sendo discutida em diversos setores: alimentício,
construção civil, transporte, infraestrutura, geração de energia. Ela está
alinhada ao pensamento contemporâneo, é leve, rápida, trabalhável e consegue
fazer um canteiro de obras em tempo muito reduzido. Não é um discurso
estético”, ressalta.
Tecnologia que gera resultados
A exploração de pinus (espécie utilizada pela Amata) se inicia no
plantio das mudas e vai até o envio da madeira tratada para o canteiro de
obras. Nesse caminho, muita tecnologia é aplicada para garantir o sucesso do
produto, a começar pela silvicultura, que no Brasil tem ótimo desempenho.
Segundo a especialista, o ciclo de crescimento das árvores é seis vezes mais
competitivo do que nos mercados americano e europeu.
Depois de extraída, a madeira passa por um longo processo de secagem,
classificação mecânica e visual, para então ser tratada (ou beneficiada). “Essa
etapa é chamada de safe inside,
isto é, embarcar tecnologia na matéria-prima”, afirma Belizário.
Na sequência, a madeira é direcionada para a linha industrial,
basicamente composta por prensas hidráulicas e um processo de usinagem. “Esse
ciclo de tecnologia garante, em cada etapa, estabilidade dimensional, precisão
e durabilidade, que são aspectos importantíssimos para a construção civil”.
O produto final – a madeira engenheirada – sai em módulos prontos para
serem montados no canteiro de obras, tal como lego, incluindo furações,
rebaixos, recortes, portas e janelas. “Os componentes hidráulicos e elétricos
são inseridos no canteiro, mas a madeira engenheirada permite que haja furação
[prévia] desses sistemas, o que costuma ser um ponto bastante crítico na
construção”, explica a arquiteta.
Nos métodos convencionais, as paredes e lajes primeiro são construídas
para depois haver os cortes, ou seja, ao utilizar madeira engenheirada há
ganhos de tempo, economia de recursos e menor risco de acidentes no canteiro.
Resultados em números
Comparando lajes de madeira engenheirada a lajes de parede de concreto,
a proporção de trabalhadores no canteiro de obras é de cinco para 80, informa a
arquiteta Ana Belizário. Ou seja, uma redução de 16 vezes na quantidade de
funcionários. De acordo com a Amata, uma taxa média de montagem utilizando
madeira engenheirada corresponde a 300 m² por dia em uma equipe de cinco
pessoas.
O sistema também resulta em redução de prazo: em um projeto cujo
cronograma esteja bem alinhado com todas as frentes de trabalho, essa redução
varia entre 40% a 50% do tempo, ganho expressivo para o canteiro de obras.
Cálculo do custo-benefício para o incorporador
De acordo com Ana Belizário, observar apenas o custo por m³ (metro cúbico)
não é a melhor forma de calcular se vale ou não a pena o investimento: “Além
dos orçamentos de obra, é importante analisar os custos indiretos que podem ser
otimizados para que o custo final geral seja equivalente ou até menor”,
avalia.
Nessa conta, é preciso considerar o tempo da obra no canteiro, a gestão
dos resíduos produzidos, o risco de atraso na entrega e todos os problemas
gerados por esse descumprimento do prazo inicial.
“Acreditamos que vai acontecer no Brasil o efeito ‘planejado versus
entregue’, como já ocorre no mundo. A viabilidade de um produto imobiliário
carrega muito risco porque o ciclo é longo, estamos falando de três anos entre
viabilidade, desenvolvimento de projeto e construção. Qualquer atraso pode ter
impacto muito grande”, explica Belizário.
Para o consumidor, o preço da unidade é competitivo em relação a imóveis
construídos com outros materiais, mas a percepção de valor é aumentada, segundo
a arquiteta: “A sensação geral para o consumidor final, via de regra, é de um
produto mais robusto, mais agradável, mais bonito e confortável”.
Qualidade, durabilidade e manutenção dos imóveis em madeira
Com madeira engenheirada, a vida útil do empreendimento alcança os 50
anos, conforme exigido pela norma de desempenho brasileira. Em relação à
temperatura interna e isolamento acústico das unidades, construções em madeira
geram maior conforto ambiental, sobretudo na questão térmica.
Para que o imóvel seja adequadamente preservado no decorrer do tempo, a
madeira engenheirada requer maior atenção principalmente à umidade, ocorrência
de cupins e outros insetos. Ainda que a madeira seja tratada industrialmente, o
monitoramento é uma forma de manutenção a longo prazo. “A madeira não exige
manutenção maior do que a necessária em outros sistemas”, diz Belizário.
Fonte: Smartus